Uma dúvida recorrente quando o cidadão estabelece residência na Itália e depois faz o pedido de reconhecimento da cidadania iure sanguinis é: “posso pedir a transcrição do nascimento do meu filho menor de idade mesmo ele não estando residindo comigo na Itália?“
A resposta não é simples nem direta, como quase tudo que envolve as normativas que regulam a cidadania italiana. Não existe, portanto, uma lei ou norma que regule explicitamente esse tipo de situação (muitas pessoas acreditam que tudo está tipificado em leis até o último mínimo detalhe).
A maioria dos oficiais de registro civil italianos (ufficiali dello stato civile, USC) não aceita transcrever registros de nascimento de filhos não residentes. Eles alegam que pelo fato de os menores não residirem no município, eles não seriam competentes a executar essa tarefa. Tal informação não corresponde ao que indicam as normativas.
Primeiro é preciso entender que o trâmite de reconhecimento da cidadania do cidadão maior de idade e residente na Itália deve estar concluído. Este cidadão é, portanto, possuidor do status civitatis italiano desde o nascimento não somente de iure, mas também agora de facto. Após essa etapa do trâmite, aí sim ele pode pedir a transcrição de registro de nascimentos de filhos menores, independentemente de onde residam.
As bases legais encontram-se no Art. 12 comma 11 do D.P.R 396/2000 (Ordinamento dello stato civile): “La trascrizione può essere domandata da chiunque vi ha interesse, con istanza verbale o con atto redatto per iscritto e trasmesso anche a mezzo posta, o dalla pubblica autorità.”
Tal interpretação foi corroborada pelo Parecer n. 3759 de 20 de fevereiro de 2019 do Consiglio di Stato e sintetizada na Circular n. 8/2019 da Direzione centrale per i servizi demografici do Ministero dell’Interno. Se quiser ler a circular na sua redação original em burocratese criptico, uma língua que se assemelha ao italiano, clique aqui.
Portanto, todo cidadão italiano tem direito de pedir a transcrição de assentos de registro civil que lhe digam respeito sem ter de passar obrigatoriamente por uma autoridade consular. Donde, por lógica cristalina, fica assegurado ao cidadão italiano, desde que assim formalmente reconhecido, pedir a transcrição do nascimento dos filhos menores diretamente no comune competente, que no caso do recém-reconhecido (“novo cidadão” de facto) é o município (o “comune“) onde ele é residente.
Se o oficial negar transcrição após pedido formal do cidadão incorre em rifiuto d’atto d’ufficio, delito previsto no Art. 328 do Código Penal italiano.
Mas, Taddone, então quer dizer que eu posso “obrigar” o oficial a transcrever o nascimento dos meus filhos?
Para responder essa segunda pergunta, é preciso lembrar que o cidadão que normalmente não fala italiano e que tem consciência de estar numa situação precária (pois é evidente que sua residência é uma ficção jurídica, embora plenamente legal) encontra-se num estado de total hipossuficiência. Os oficiais são cientes disso e “deitam e rolam”. Sabem que é difícil para esse cidadão fazer valer os seus direitos e que quase sempre terá que pagar os serviços de um advogado para que o defenda, algo que custa caro.
Então o oficial faz algo chamado de “gaming the system”. Ele conhece as regras e vai se aproveitar até quando puder continuar blefando. Só muda de ideia quando o calo apertar.
Afinal, vale a pena brigar?
A resposta a essa terceira pergunta é sempre: “depende”. Cada um deve avaliar quais são suas condições e objetivos. Por isso é importante ter uma ideia bastante concreta da sua situação e agir conforme as circunstâncias. Se o cidadão vai voltar em breve ao Brasil e não tem pressa para a transcrição dos filhos o melhor é sorrir e seguir seu caminho. Se a ideia é emigrar para outro lugar e levar os filhos num curto período, talvez valha a pena pagar o advogado para não ter de depender de consulados e seus prazos bíblicos e assim começar o quanto antes uma nova etapa de vida.
In bocca al lupo!
CASOS PRÁTICOS
Vejam o que diz o oficial de registro civil do Comune di Sona (Vercelli):
PRECISAZIONI
Figli minori
I figli minori per effetto del riconoscimento del possesso della cittadinanza italiana del genitore, acquisiscono dalla nascita la cittadinanza italiana senza necessità di procedimenti aggiuntivi. Il fatto che il figlio sia presente o meno sul territorio italiano, è irrilevante: una volta trascritto l’atto di nascita su richiesta del genitore, se residente si iscriverà in Anagrafe, se residente all’estero, il genitore dovrà richiedere l’iscrizione del minore all’AIRE, tramite il consolato italiano competente per territorio.
Tal informação está no próprio website do comune e pode ser lida clicando aqui.
E agora o que diz o Comune di Pisa (atualizado em 2 de abril de 2021):
Figli minori
I figli minori per effetto del riconoscimento del possesso della cittadinanza italiana del genitore acquisiscono dalla nascita la cittadinanza italiana senza necessità di procedimenti aggiuntivi. Il fatto che il figlio sia presente o meno sul territorio italiano, è irrilevante: una volta trascritto l’atto di nascita su richiesta del genitore, se residente si iscriverà in Anagrafe, se residente all’estero si predisporrà un’iscrizione Aire.
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