Digam “não” aos abusos!
Diariamente muitas pessoas me escrevem relatando os mais variados abusos obstrucionistas cometidos por agentes públicos italianos, seja em consulados, seja em municípios italianos. Alguns relatam beiram o inacreditável, mas já não duvido de mais nada.
A lei que rege o funcionamento da administração pública italiana é a Legge 7 agosto 1990 n. 241, cujo título é “Nuove norme in materia di procedimento amministrativo e di diritto di acesso ai documenti amministrativi“. Em sua primeira parte, que estabelece seus princípios norteadores, logo no seu artigo 1º. parágrafo I, está claramente estabelecido que:
A atividade administrativa persegue os fins determinados pela lei e é regida por critérios de economicidade, de eficácia, de imparcialidade de publicidade e de transparência segundo as modalidades previstas pela presente lei e pelas outras disposições que disciplinam cada um de seus procedimentos, bem como pelos princípio do ordenamento comunitário [isto é, da União Europeia].
O artigo 2º. dita que:
A administração pública não pode agravar [sobrecarregar, tornar mais complexo] o procedimento se não for por extraordinárias e motivadas exigências impostas pela realização do trâmite.
Portanto, percebam que o agente público, seja ele cônsul-geral, funcionário administrativo, prefeito de um pequeno município ou atendente da Questura, deve se pautar por esses princípios básicos. Funcionários públicos italianos NÃO TÊM licença para criar leis e normas a seu gosto, nem muito menos de tornar a vida do cidadão um inferno. O obstrucionismo existe porque os cidadãos se calam.
Vejo muita gente por aí dizendo que eles podem fazer o que bem quiserem e que nada pode detê-los. Já li também e-mails escritos por funcionários consulares em que se arrogam o direito de pedir “qualquer outro documento” a seu bel-prazer. Sei que a realidade é dura, mas a lei não permite esse tipo de abuso.
Outra coisa importante que devemos saber: funcionários públicos em geral e italianos em particular só respeitam quem sabe se impor. Salvo raras exceções, obviamente. É triste que seja assim, mas se o cidadão fizer “corpo mole” demais eles montam em cima. Se eles perceberem que o cidadão não domina minimamente o tema tratado vai conseguir inventar qualquer coisa.
Nestes últimos dias, recebi vários relatos sobre exigências absurdas feitas pela chancelaria consular da Embaixada em Brasília que fez uma convocação em massa de pessoas que estavam na fila. Dada a repetição do mesmo padrão de exigências absurdas, fica óbvio qual é a estratégia por trás disso: convocar muita gente, fazer exigências absurdas a serem cumpridas em pouquíssimo tempo, atordoá-las e fazê-las desistir do reconhecimento da cidadania.
Isso tudo é uma preparação, como já disse noutro artigo, para “zerar” a fila e jogar todo mundo na loteria do sistema Prenota Online.
É essencial que todos saibam que exigências absurdas devem ser contestadas. A embaixada está mandando retificar coisas como:
Nicolau > Nicola
José > Giuseppe
João > Giovanni
E o prazo dado ao cidadão são 10 dias corrido. É inacreditável! É abusivo! O funcionário da embaixada não pode exigir qualquer coisa que lhe dê na telha! Lembrem-se dos artigos 1 e 2 da Lei 241/1990 mais acima: a administração pública tem de exercitar a razoabilidade.
Mas o quê fazer? A primeira coisa a fazer é não assinar a carta de desistência que eventualmente tentarem impor. Pague a taxa de 300 euros e solicite a negativa (provvedimento di diniego) por escrito com a motivação. Desta forma, o funcionário será obrigado por dever de ofício a listar os motivos pelos quais seu pedido não foi aceito. Isso quase sempre já é suficiente para demonstrar que o funcionário estava blefando na expectativa que o requerente desista sem reagir. Quando ele se vê na obrigação (que é seu dever de ofício como repito sempre) de colocar por escrito e em língua italiana num “provvedimento di diniego” oficial as exigências absurdas que fez , o funcionário pensará muitas vezes antes de prosseguir.
Na maioria das vezes isso já basta para dissuadir o funcionário e evitar o obstrucionismo. Caso o funcionário resolva de fato negar e faça o “provvedimento di diniego”, é necessário analisar as razões alegadas para a negativa e se elas têm embasamento legal. Para isso você pode pedir minha opinião informalmente ou eventualmente de um advogado italiano especializado na área.
Se as razões alegadas parecerem não ter fundamento ou fogem da razoabilidade, recorra sempre por escrito, preferencialmente em carta física por correio tradicional. Escreva sempre em bom italiano. O ideal é procurar um bom tradutor que possa redigir uma boa carta com sua contestação.
Se quiserem ser ainda mais efetivos, e é o que eu faria, contrataria um advogado italiano para defender a família desses abusos, demonstrando ao órgão público que existe a disponibilidade de ir até os tribunais para questionar esse tipo de obstrucionismo.
Vejo muita gente desistindo, cansados e decepcionados. Não tem de ser assim, há sempre outro caminho. Não façam justamente o que eles querem, que é desistir. O troféu de quem faz obstrucionismo é a sua desistência. Non mollare!
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